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PONTOS DE DESTAQUE

O arquiteto Charles Durrett, da Califórnia, especialista em "moradias compartilhadas" (= cohousing), fala sobre o seminário que ofereceu a um grupo de interessados no assunto, em 2011. Ele e sua esposa Katheryn McCamant, ganhadores de vários prêmios, construíram a primeira cohousing nos Estados Unidos (atualmente, já contam com mais de cinquenta). Segue, abaixo, o que disse Durrett sobre este conceito que, há alguns anos, vem despertando o interesse de determinados grupos aqui no Brasil. 

O que vem a ser cohousing?

Segundo Durrett, são grupos de pessoas que desenvolvem um projeto de moradia compartilhada em uma àrea por eles escolhida. É basicamente um projeto de moradia feito sob encomenda. Existem tipos diferentes de cohousing. Este (senior cohousing/cohousing-sênior), particularmente, é um projeto desenvolvido para pessoas de mais idade (adultos-sênior) para que possa corres-ponder às necessidades, às carências e aos desejos destes futuros moradores. Não se trata de "assisted care/cuidados assistidos" e nem de nenhum tipo de "institutional care/cuidados institucionais". É projetado para atender às carências desse grupo em particular. 

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Comentário: Durrett, apesar de ser arquiteto, definiu "cohousing" como "grupos de pessoas", ou seja, a ênfase, neste tipo de comunidade compartilhada, volta-se para as pessoas, deixando, em segundo plano, as casas em que moram. O objetivo principal de uma cohousing é exatamente estimular o convívio entre os moradores.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 Charles Durrett: Toda vez que visito uma comunidade destas, para adultos-sênior, eu penso, "eles [na companhia um do outro] estão se divertindo como nunca", em vez de ficarem isolados numa instituição ou até mesmo em suas casas.

 PESQUISA DESENVOLVIDA COM ADULTOS-SÊNIOR NOS ESTADOS UNIDOS

 

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Glass, Anne P. & Rebecca S. Vander Plaats. 2013. “A Conceptual model for aging better together intentionally", Journal of Aging Studies 27, 428-442:

 

Neste artigo, uma tradução livre do resumo (Abstract ), estas são as perguntas de pesquisa:

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(1) O que acontece quando adultos-sênior decidem viver em uma comunidade em que podem, consciente e coletivamente, falar do envelhecimento?

(2) É possível envelhecer melhor estando juntos por opção?

(3) Em caso positivo, como seria essa experiência, em que circustâncias ela começa a florescer, e como pode melhorar a experiência do envelhecer?

 

      Entrevistas extensas foram conduzidas, em 2009, com 26 moradores de uma cohousing (residência comunitária para adultos-sênior), todos, em sua maioria, da cor branca e do sexo feminino, com idade média de 73 anos. A análise temática das transcrições apontou para um modelo conceitual de melhor envelhecimento das pessoas que, intencionalmente, optam por morar em conjunto. Três anos mais tarde, para validar o modelo, foram coletados dados adicionais. Os resultados mostraram que  a estrutura de enfrentamento conjunto forneceu o mecanismo necessário para que os sujeitos pudessem envelhecer melhor, em companhia de seus pares, por opção própria (intencionalmente). 

 

       Os dados quantitativos sustentam que os benefícios desse tipo de moradia comunitária são os seguintes: ajuda mútua, aumento na aceitação do envelhecimento, além de sentimentos de segurança, de menos preocupação e menor sensação de isolamento social. A pesquisa evidencia o poder que os adultos de mais idade possuem, a heterogeneidade da experiência do envelhecer e o valor que existe na troca de conhecimentos entre eles, a respeito do processo de envelhecimento. Segundo as autoras, esse modelo conceitual de se viver melhor, junto de seus pares, por opção própria, poderá servir de base para intervenções em outras situações a fim de proporcionar, aos adultos-sênior, uma nova forma de enfrentarem, juntos, o envelhecimento, com melhor qualidade de vida

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A conceptual model for aging better together intentionally ... 

www.academia.edu/7857995/A_conceptual_model_for_aging_better...

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 Comentários selecionados, feitos pelos sujeitos de Glass e Plaats, sobre os benefícios da residência comunitária (tradução livre):

Ajuda mútua: (A) “Sabe? Já aconteceu com algumas pessoas que caíram e tal e aí, precisaram de ajuda; então, pelo menos, a gente não precisa chamar ninguém para fazer nada para você. A agente de saúde [care coordinator] pode fazer isso para você;  (B) Aos poucos a gente vai compreendendo que precisar de ajuda e aceitar não tem nada de mais; tudo bem. 

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Aceitação gradativa do envelhecimento: (A) “Bom, acho que não, não tenho mais nenhuma dificuldade em aceitar [ajuda]. Então, acho que tem ajudado porque eu vejo muita gente em situação igual à minha, sabe? Já não são tão fortes como eram, viu? Ou eles não conseguem mais fazer certas coisas ou então conseguiam fazer coisas e trabalhar seis horas direto e então paravam para uma pausa. Agora, se eu faço isso durante duas horas, eu tô morta: “Pronto! Por hoje, chega!” E no dia seguinte, eu tenho de ficar descansando, sabe? Esse tipo de coisa. Então, eu acho que ajuda muito ficar na companhia de pessoas da sua idade, pois todos entendem isso, e aí a gente pode dizer assim: “Meu Deus, viu? O que foi que ela disse?” Ou então: “Não consegui ouvir”, e aí todo mundo diz, “é isso aí.” [risos]; (B) Muita coisa acontece, que você nunca tinha pensado antes, porque, de repente, você ficou mais velha e você nunca tinha sido velha antes. [risos]. 

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Sentimento de segurança/menos preocupação/diminuição do isolamento social: “Saber que tem pessoas à sua volta e que, se você precisar de alguma coisa ou se acontecer alguma coisa no meio da noite, você vai ter alguém para chamar. Porque, se você morasse em qualquer lugar da cidade, isso seria diferente.”    

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De um total de 26 residentes (de 73 anos de idade em média):

 

De 93% a 100% concordaram (totalmente ou em parte) que:

 

(A) muitas pessoas ali se encontram em situação semelhante;

(B) o envelhecimento é encarado com realismo;

(C)  aprender a envelhecer é o objetivo da comunidade;

(D) as questões relativas ao envelhecimento são discutidas nas reuniões dos grupos;

(E) trocam informações sobre o envelhecimento;

(F) estão aprendendo muito sobre o envelhecimento com os outros residentes; 

(G) compartilham casos engraçados sobre o envelhecimento;

(H) na comunidade, uns ajudam os outros;

(I) cada um escolheu um vizinho para ficar de alerta (caso necessário);

(J) juntos, os moradores trabalham para melhorar sua vida;

(K) dependem da ajuda uns dos outros;

(L) estão satisfeitos com a ajuda que recebem dos outros moradores;

(M) viver ali faz com que se sintam seguros;

(N) estão satisfeitos com a companhia dos outros moradores e com a socialização entre eles;

(O) estão satisfeitos, por terem com quem contar, em caso de emergência.

A conceptual model for aging better together intentionally ... 

www.academia.edu/7857995/A_conceptual_model_for_aging_better...

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(1) Varandas na frente das casas: Em comunidades comunitárias, apesar de haver outras comodidades, como a “casa comunitária”, onde os moradores passam a se conhecer, as varandas são muito importantes. Elas dão vida à comunidade, estimulando a interação entre os residentes. Depois de terem se conhecido na casa comunitária, um morador, ao passar pela casa de um outro, que se encontra em sua varanda, já se sente à vontade para se aproximar e conversar. Como acontecia há tempos atrás, em cidades do interior,  os vizinhos sempre tinham um motivo para conversar uns com os outros (a nova escola, uma inundação, etc.). Segundo Durrett, quando se tem um pretexto para conversar, fica mais fácil cultivar um relacionamento e, a partir,daí, criar laços com as pessoas. De acordo com Durrett, as pessoas que moram nessas comunidades ficam 80% do tempo na varanda da frente e o restante no quintal dos fundos.

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(2) Incorporadoras  versus cohousing: Construir casas para vender, diz Durrett, transformou-se em um grande negócio, compartilhado por arquitetos, banqueiros, burocratas e investidores. Construir uma cohousing é outra história porque os moradores se envolvem, humanizando a conversa. Não se trata de fazer nada novo. Trata-se de fazer deliberadamente o que, antes, fazíamos naturalmente

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(3) Perguntas aos futuros moradores: Começamos sempre, continua Durrett, com as mesmas perguntas a fim de que os objetivos coletivos e os individuais sejam colocados à mesa. Para isso, o arquiteto deve fazer perguntas como estas aos futuros moradores:

(A) Quais são os seus objetivos? Facilitar a vida na comunidade? Interagir com os vizinhos? Manter a própria privacidade? (B) E as atividades? Que verbos poderiam tornar a vida de todos melhor? Conversar de fato com meu vizinho? Tornar a vida mais fácil, mais interessante, mais divertida, etc.? E qual seria o lugar, o local apropriado para isso? Um salão ou uma sala com boa acústica? Com boa iluminação? Ou, quem sabe, um lugar aconchegante, convidativo, para onde dá vontade de ir, dá vontade de ficar?

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(4) Ouvir os moradores: Conversar com os futuros moradores sobre suas necessidades, carências e desejos, na verdade, corta caminho porque eles se envolvem emocionalmente com o projeto, lutam por ele. O mantra de Durrett é: se não funciona socialmente, por que perder tempo? Em seus projetos, Durrett dá “carta branca” aos moradores; ele apenas intervém nos momentos necessários (para evitar que os moradores se deixem levar por desejos irreais, ao quererem, por exemplo, incluir comodidades acima de suas possibilidades financeiras). 

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(5) Privacidade em residências comunitárias: Deve haver um equilíbrio entre a privacidade de cada um e a vida comunitária, a fim de que seja possível ter o tanto quanto possível de privacidade e de comunidade (“as much privacy as possible and as much community as possible”). 

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(6) Gerenciamento: Em uma cohousing, 100% do gerenciamento é feito pelos residentes. Conforme afirma Durrett, “cooperation trumps architecture” (a cooperação entre os moradores supera a arquitetura, a criação dos ambientes), ou seja, sem cooperação, não funciona. O embasamento teórico do seu trabalho vem da antropologia, que coloca, em primeiro plano, o lado humano (os moradores).

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Alguns dados quantitativos da pesquisa de A.P.Glass e R.S. Vander Plaats: Journal of Aging Studies 27 (2013), p. 438:

 “Uma conversa com Charles Durrett” (56:37)

 O arquiteto Charles Durrett profere uma conferência para profissionais e para acadêmicos em Adelaide, Australia, durante uma turnê em março de 2016. Como bem lembra Ken Long, o apresentador, o termo “cohousing”, que já consta no Oxford English Dictionary, foi cunhado por Charles Durrett [e por sua mulher, também arquiteta, Katheryn McCamant]. Apenas a palavra foi cunhada por eles, pois, segundo Durrett, o conceito é atemporal (“cohousing is a timeless concept”), conforme afirma no início da palestra, e o projeto inicial foi desenvolvido na Dinamarca (conforme esclarece também no início da palestra). 

 Durrett, autor de inúmeros livros e ganhador de vários prêmios nos Estados Unidos e internacionalmente, até essa data, já projetou mais de cinquenta comunidades comunitárias para adultos-sênior (senior cohousing). Entre suas publicações, destacam-se Creating Cohousing e The Senior Cohousing Handbook. O que melhor define o trabalho de Durrett é sua capacidade de criar vida entre as casas, entre os prédios (“to create life between buildings”).

 

 Ao lado, alguns destaques da palestra nas palavras de Durrett (em tradução livre):

 Abaixo, destacam-se outras observações importantes de Durrett, feitas durante a palestra:

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         Influência de sua origem no seu trabalho: Durrett cita o exemplo da cidade onde nasceu, que tinha apenas 350 habitantes, onde todos se conheciam. Diz também que já morou em meio ao burburinho de uma cidade grande, São Francisco (EUA), bem no centro. Foi devido a essa experiência que decidiu construir ali uma cohousing. O que fez foi trazer a qualidade de vida que tinha em sua cidade natal, para dentro de uma metrópole. [Pelo seu trabalho, revelado, por meio de slides, aos participantes do evento, percebe-se que vem fazendo isso até hoje em várias partes do mundo.]

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               Áreas verdes versus áreas asfaltadas: Seus projetos usam, segundo ele, 1/6 do asfalto gasto em cada casa de determinados condomínios; quer dizer, nas comunidades que projeta, prevalecem as áreas verdes, cheias de vida. Além disso, ele faz o projeto pelo preço que os moradores podem pagar. Por isso, o preço das casas tem um teto: o que os moradores podem pagar. Todas as escolhas, portanto, devem ficar dentro desse limite. Segundo ele, hoje, nos Estados Unidos, constroem-se mais residências comunitárias para famílias do que especificamente para adultos-sênior (seniors).

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         Pessoas de mais idade: Viver isolado [em uma casa ou em instituições para idosos] equivale a fumar um maço de cigarro por dia. Viver em residências comunitárias, em companhia de seus pares, prolonga, em mais ou menos dez anos, a vida do idoso.

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        As três coisas mais importantes: Para que o idoso tenha uma vida feliz, é preciso (a) comer bem (comida leve), (b) fazer exercício (de pouco impacto), e (c) estar conectado (numa comunidade).

 "Ambientes fantásticos [great] existem não por obra dos arquitetos, mas por obra das culturas. Charles Durrett,The Senior Cohousing Handbook: A Community Approach to Independent Living

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